Em meio às discussões do orçamento de 2021, ventila-se a possibilidade do governo brasileiro aumentar em alguns poucos bilhões os investimentos na infraestrutura brasileira. Contudo, mesmo que pareça paradoxal, ajudaria mais o segmento se a opção governamental fosse simplesmente não gastar.
Historicamente o Brasil nunca fez o dever de casa na infraestrutura: o investimento atual é de apenas 1,8% do PIB, quando o adequado, seguindo o padrão de outros países, seria entre o dobro e o triplo disso. Não à toa, no pilar de infraestrutura do Ranking de Competitividade de 2019 do Fórum Econômico Mundial, o Brasil ficou apenas na 78º posição. O resultado é um cenário de baixa produtividade, que é retroalimentado por outros problemas estruturais brasileiros — um capital humano pouco qualificado, políticas protecionistas e ambiente de negócios caótico.
Há, portanto, muita demanda por infraestrutura logística, sanitária e digital, mas quem deveria protagonizar um ponto de virada não é o governo, mas sim o mercado de capitais. Isso se dá, mormente, porque a Selic em um único dígito significa uma oportunidade histórica para o Brasil.
Inicialmente, porque apesar das intenções de alguns integrantes do governo, a situação fiscal atual não permite a alocação de mais recursos para o setor. O equilíbrio fiscal é essencial para que a taxa de juros mantenha-se em patamares historicamente baixos, o que por sua vez torna mais atrativo investir em projetos como ferrovias, portos e aeroportos. Tratam-se de concessões de duração longa, que remuneram os investidores a um premium adequado e que, concomitantemente, trazem benefícios para toda a população.
A iniciativa privada já é responsável por dois terços dos investimentos em infraestrutura, mas tem potencial para fazer muito mais. No entanto, o requisito básico para qualquer aplicação é haver segurança jurídica e estabilidade macroeconômica — dois fatores que o Brasil ainda deixa a desejar.
Como o governo pode ajudar a infraestrutura: reformas regulatórias
Para ajudar nesse processo, o governo Bolsonaro e o parlamento podem ajudar, justamente, a partir de reformas regulatórias nestes setores a fim de pavimentar o caminho para atrair mais capital privado.
Um exemplo foi o Novo Marco do Saneamento Básico, promulgado em julho deste ano. As duas primeiras licitações no setor estão rodando neste mês de outubro e já garantiram mais de R$ 3 bilhões em investimentos na região metropolitana de Maceió, em Cariacica e Viana. Ao longo de três décadas será investido pela iniciativa privada nessas regiões mais do que em toda a história, algo que não seria possível sem a reforma regulatória e um cenário de juros baixos.
Vale ressaltar que esse montante corresponde à metade dos R$ 6 bilhões que o governo tenta incrementar na pasta do orçamento para 2021 — um dinheiro que simplesmente não existe.
Essa mesma premissa presente para saneamento básico vale para a Lei do Gás (já em fase final de tramitação no Senado), para a nova Lei da Cabotagem e das Ferrovias, além do Leilão do 5G, a ocorrer em 2021.
O estado brasileiro, portanto, não deveria se preocupar em gastar, mas sim com reformas regulatórias e com responsabilidade fiscal para possibilitar a manutenção dos juros baixos e tornar possível o investimento privado em infraestrutura. Por fim, também é possível aperfeiçoar a estruturação de projetos para atrair investidores.
Todavia, do contrário, caso o governo insista nele próprio protagonizar os gastos em infraestrutura, haverá maiores incertezas sobre a manutenção da Regra do Teto de Gastos e desconfianças em relação a sua agenda econômica. As consequências nesse caso serão não apenas maior pressão para aumento de juros futuros, um processo que já está em andamento desde agosto, mas a insistência em um erro histórico cometido consecutivamente pelo estado brasileiro. O diagnóstico é simples: os políticos brasileiros ajudarão muito se não atrapalharem o mercado de capitais.