Mais de 100 milhões de celulares já foram roubados ou furtados no Brasil. A estimativa é do levantamento do Mobile Time/Opinion Box. E ao menos 64 milhões de cidadãos com mais de 16 anos já foram vítimas desse tipo de crime. Em caso de furto, a pena máxima é de quatro anos, com o indivíduo respondendo em liberdade. A pena branda negligencia a gravidade e os danos de um roubo de aparelho telefônico.
As consequências vão muito além do valor material do aparelho roubado, em que a maioria varia entre R$ 1 mil e R$ 14 mil no Brasil. É fundamental entender que o roubo de um celular implica em uma invasão à privacidade, à segurança pessoal e à integridade emocional das vítimas. Em virtude da mudança no comportamento dos criminosos, as penas para roubo e furto de celular deveriam ser endurecidas.
Roubo de celular não é algo trivial
Um dos principais aspectos que diferenciam o furto de celular dos demais furtos é o fato de que, por meio desse dispositivo, é possível ter acesso a uma quantidade enorme de informações pessoais. As pessoas utilizam seus celulares para armazenar contas, senhas, informações bancárias, fotos íntimas e até mesmo detalhes de suas vidas profissionais, como contatos de clientes. A perda desses dados pode resultar em consequências graves, como roubo de identidade, fraude financeira e até mesmo extorsão.
O simples fato de um celular ser roubado já é um grande transtorno para a vítima. Além de perder o aparelho, ela precisa lidar com as consequências da invasão à sua privacidade e segurança. Contas bancárias podem ser acessadas, senhas alteradas e informações pessoais expostas. A vida da pessoa passa a estar literalmente nas mãos do criminoso. Ao considerar a gravidade desse fato, é inconcebível que o furto de celular seja encarado apenas como um furto comum, como é tratada a questão no direito penal brasileiro.
Crime organizado agora mira celulares
Nas décadas de 1980 e 1990 facções criminosas se profissionalizaram para a realização de sequestros no Brasil.
Fonte: Public security and kidnappings in Rio de Janeiro (1995-1996)
Já no século XXI, os sequestros tradicionais se tornaram menos comuns devido ao aumento das medidas de segurança, como câmeras de vigilância, rastreadores e o fortalecimento das forças de segurança. Esse conjunto de fatores aumentou os riscos inerentes aos processos relacionados a operações de sequestros, que envolvem levar a vítima para cativeiros e as manterem lá durante o processo de negociação. Com a popularização de smartphones, roubar somente o aparelho e invadir as contas bancárias da vítima se tornou uma opção muito mais vantajosa para as quadrilhas do crime organizado.
O Primeiro Comando da Capital (PCC), uma das maiores organizações criminosas do Brasil, se especializou em crimes cibernéticos. Eles têm contratado hackers e pessoas especializadas em tecnologia da informação para atuarem em seus esquemas. O dinheiro obtido com o roubo de celulares tem sido lavado não apenas no Brasil, mas também em outros países como Argentina, Colômbia e Portugal.
O volume de fraudes digitais e roubos de celular no Brasil resultaram em um prejuízo de R$ 71,4 bilhões em um período de 12 meses. O levantamento do DataFolha levou em conta crimes digitais com máquinas de cartão, boletos falsos e golpes com Pix.
Congresso Nacional deveria endurecer as penas para roubo de celulares
Diante desse cenário, parlamentares deveriam reconhecer a gravidade do furto/roubo de celular e passar a tratá-lo como um crime específico, com penalidades adequadas e proporcionais ao fato. A simples resposta em liberdade para os autores desse delito não é suficiente para coibir sua prática.
Como o Nobel de Economia Gary Becker e seus estudos sobre teoria do crime abordam, sem uma expectativa de sanção considerada rígida, criminosos não se sentem dissuadidos de cometerem crimes. Em outras palavras, o indivíduo racionaliza o custo de oportunidade entre o produto de sua prática criminosa (expectativa de lucro) com a probabilidade de punição (multa, reclusão e tempo respondendo em regime fechado).
Medidas mais efetivas devem ser adotadas, como o agravamento da pena e a criação de mecanismos de combate a esse tipo de crime, incluindo ações de prevenção, investigação e punição aos envolvidos.
Além disso, é importante promover a conscientização da população sobre a segurança dos dispositivos móveis. Os usuários devem ser orientados a adotarem medidas de proteção, como o uso de senhas fortes, a ativação de recursos de rastreamento e bloqueio remoto, bem como o armazenamento seguro de informações sensíveis. Há ainda a possibilidade de seguro, pouco utilizado no Brasil. A pesquisa ‘O Brasileiro e seu Smartphone’, do Panorama Opinion Box, evidencia que somente 11% dos aparelhos possuem seguro, o que poderia mitigar os danos em caso de furtos e roubos.
Portanto, o Congresso deveria analisar a questão e parar de encarar a subtração de celulares como um furto ou roubo comum. Ou se reconhece a gravidade do problema e adotar ações efetivas para prevenção e punição dos responsáveis, ou os brasileiros ficarão à mercê da violência urbana e do crime cibernético.