Uma das principais promessas da campanha de Lula (PT) era a aprovação de uma reforma tributária ampla. O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços Geraldo Alckmin (PSB) defende que ela seja aprovada ainda no primeiro semestre.
A coluna explora o que se sabe até agora da proposta e quais as expectativas de tramitação da reforma tributária.
O que o Governo Lula indicou até agora sobre a reforma tributária
A criação da Secretaria Extraordinária do Ministério da Fazenda para a Reforma Tributária foi uma sinalização de prioridade da pasta para essa reforma econômica.
O secretário escolhido é o economista Bernard Appy, que integrou o Ministério da Fazenda entre 2003 e 2008 ao comandar a Secretaria de Política Econômica e a Secretaria Extraordinária de Reformas Econômico-Fiscais.
Ele é considerado uma referência no debate sobre reforma tributária no país por ter dirigido o Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) e ter sido o coautor de uma das principais sugestões de reforma tributária discutidas no legislativo, que é a proposta de emenda à Constituição (PEC) 45, cujo autor é o deputado federal Baleia Rossi (MDB/SP).
Na semana passada, Appy detalhou em eventos alguns pontos da proposta do Governo que deve ser apresentada ao Congresso em abril, e que tende a aproveitar partes da redação tanto da PEC nº 45/19 quanto da PEC nº 110/19 que tramita no Senado. Os principais pontos destacados são:
• Será criado o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) mas serão necessárias a criação de algumas regras especiais e exceções;
• Haverá a criação de um fundo de desenvolvimento regional para substituir a política de benefícios fiscais nos estados;
• A reforma sobre os impostos de consumo deve unificar a cobrança do ISS e do ICMS, que atualmente é recolhido respectivamente pelos municípios e estados. Appy afirma que “Não há nenhum país relevante no mundo que tributa de forma diferente serviço e consumo, exceto o Brasil”; A Frente Nacional dos Prefeitos, que representa gestores de municípios com mais de 80 mil habitantes, é favorável a manuntenção do ISS e critica essa parte do projeto. Para tentar diminuir resistências, será proposta uma gestão paritária do imposto, com estados e municípios tendo o mesmo poder de decisão, mas extinguindo o ISS;
• Para manter a arrecadação atual, as alíquotas do IVA teriam de ser de 9% para a União, 14% para os estados e 2% para os municípios. Segundo Appy, a reforma tributária será desenhada para não aumentar carga tributária “em hipótese alguma”, mas a avaliação é de que o valor das alíquotas está em aberto e será negociada no parlamento. Além disso, diante de incertezas fiscais, há o risco de ao invés de se aprovar uma reforma tributária haver pressão no Congresso para se aumentar impostos;
• Está em estudo a apresentação de alternativas para se manter a competitividade da Zona Franca de Manaus.
As expectativas de aprovação da reforma tributária
Segundo Appy há um relativo consenso sobre a proposta que permitirá que seja possível a aprovação pelas duas Casas legislativas da reforma no primeiro semestre, mas a projeção não apenas é avaliada como muito ousada quanto tende a não ocorrer por se tratar de um assunto muito sensível.
Um paralelo interessante é que no primeiro Governo Lula, foi encaminhada uma proposta tímida de reforma tributária e ela foi concluída somente em dezembro. Vale ressaltar que a configuração do Congresso à época era mais favorável ao Governo do que atualmente.
Uma tendência é a de se fatiar a reforma tributária em diversos pontos para facilitar a aprovação de ao menos alguns dos pontos principais defendidos pelo Governo.
Em um gesto favorável, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), criou um Grupo de Trabalho para acelerar a construção do texto e apresentar parecer até meados de maio. O coordenador responsável é o deputado Reginaldo Lopes (PT/MG), que foi o líder do PT na Câmara em 2022, com a relatoria do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB)
Ele tem como prazo de funcionamento 90 dias, prorrogáveis por mais 90. O objetivo é revisitar as discussões sobre a mudança tributária, a fim de auxiliar na elaboração do novo sistema tributário e garantir apoio dos parlamentares. A composição é de 12 parlamentares:
– Adail Filho (Republicanos/AM).
– Aguinaldo Ribeiro (PP/PB);
– Glaustin da Fokus (PSC/GO)
– Ivan Valente (PSol/SP);
– Jonas Donizette (PSB/SP);
– Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL/RJ);
– Mauro Benevides Filho (PDT/CE);
– Newton Cardoso Junior (MDB/MG);
– Saullo Vianna (União/AM);
– Sidney Leite (PSD/AM);
– Reginaldo Lopes (PT/MG);
– Vitor Lippi (PSDB/SP);
Segundo Lopes, serão realizadas audiências para coletar as opiniões do setor produtivo, dos trabalhadores, dos governadores e do governo federal. Ele ainda indicou que o Senado deve indicar um relator para acompanhar a discussão ainda na Câmara. Segundo o parlamentar, a proposta deve incluir:
– Progressividade tributária: os mais pobres devem ser atendidos com a devolução do imposto pago na compra de itens da cesta básica, saúde e educação;
– Demandas de governadores devem ser atendidas com a criação de uma compensação quando houver queda da arrecadação com a reforma;
– Criação de fundo para compensação da extinção de incentivos fiscais.
A criação do GT foi prejudicada por lideranças da oposição por entenderem que gerará prejuízo à discussão, atropela o regimento interno da casa e que não há representação regional proporcional. O deputado Marcel van Hatten (Novo/RS) afirmou que não há parlamentares no grupo de trabalho de SP, PR, SC e RS, que são alguns dos maiores responsáveis pela arrecadação do país. “Lembra uma piada antiga de que alguns estados são chamados apenas para pagar a conta”, ironizou.
Lira afirma que a redação da reforma tributária será um texto “possível” para ser levado a votação em Plenário. Vale lembrar que a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), que dá maior representatividade a pequenos municípios, tem apoiado a reforma por acreditar que haverá crescimento da arrecadação.